quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Meu primeiro chocolate

Diga-me, você se lembra do primeiro chocolate que comeu? Provavelmente não, né?
Pois acredite, eu me lembro muito bem.
Os tempos são da Alemanha pós-guerra, época à qual  os alemães que conhecí ao longo dos tempos sempre se referiam como Nachkriegszeit, tempos de penúria, falta de comida, falta de moradia, gente perambulando pelas ruas, ocupação de soldados americanos no bairro em que morávamos, saques, estupros, roubos, desconfiança, falta de trabalho, falta de dinheiro, mercado negro, etc.
Eu, muito criancinha, não percebia nada disso, achava tudo normal.
Num dia de neve meus irmãos e eu brincávamos à beira da rua quando, vagarosamente, passou um caminhão do exército americano cheio de soldados. Um deles, um negro, e era a primeira vez que via um negro, enfiou a mão no bolso da camisa e retirou um pacote vermelho e, muito sorridente, jogou-o para nós e deu-nos um tchauzinho. Corremos para apanhar o pacotinho vermelho na neve branca e, lembrando que não podíamos aceitar nada de estranhos, corremos para casa e mostramos para nossa mãe.
Ela, estupefata, imediatamente nos disse que era uma coisa muito boa, era chocolate, que não conhecíamos. Enfiou rapidamente debaixo do cobertor da cama e abriu, partindo a barra marron em três pedaços, e cada um de nós adorou a sua parte. Acho que ficamos com cara de “quero mais”.
Porque enfiou debaixo do cobertor? Para não fazer barulho com o papel prata. Porque? Porque a nossa casa não fora bombardeada durante a guerra e como consequência foi “ocupada”pelo governo provisório, ou seja, cada quarto da casa foi dado para uma família estranha. Nós ficamos com a sala e a cozinha e o banheiro eram de uso comum. Todos eram obrigados a conviver dessa forma.
Todos passavam fome e uns vigiavam os outros, os roubos de comida eram comuns, assim como demais desavenças.
Daí ela ter enfiado o chocolate debaixo do cobertor para abrir sem fazer barulho e garantir a guloseima inusitada só para seus filhos.
Lembro sempre deste soldado americano com muita gratidão. Onde andará?

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